domingo, 3 de julho de 2011

Carta a Dep. Myrian Rios

Gente,
recebi esse vídeo, parodiando a Dep. Myrian Rios:
http://www.youtube.com/watch?v=LAwCKPiRH1I
Me fez pesquisar sobre o assunto. A PEC 23/2007 foi votada (e rejeitada) no final de Junho, na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro. Tratava da inclusão da questão da "orientação sexual" na Constituição do Estado do Rio. Acho até que as últimas conquistas no STF a favor dos direitos dos homossexuais suplantam a questão. Mas o que me chamou a atenção foi o discurso da Dep. Myrian Rios. Assistam em:
http://www.youtube.com/watch?v=njz0VWRUm0k&feature=related
E tirem suas próprias conclusões!
As minhas estão na carta abaixo:


Cara Myrian,
Acabei de ver o seu discurso na Assembléia Legislativa, sobre a votação da PEC 23/2007. Apesar de discordar do seu ponto de vista, e de achar que algumas das suas colocações e imagens foram bem infelizes (a comparação de lésbica com pedófila, por exemplo, foi péssima!), acho que entendi a sua colocação. E, na essência, concordo.
Ou seja, também acho que, se uma pessoa te incomoda, seja pela sua opção sexual, seja pela sua aparência ou por qualquer outro motivo, você deve sim ter a liberdade de não tê-la como sua funcionária (claro que estamos falando do âmbito particular, e não do funcionalismo público). Aliás, que eu saiba, você nem precisa expor seus motivos. Mesmo não sendo um expert no assunto, ouso dizer que a constituição lhe garante esse direito. Você pode a qualquer momento despedir uma pessoa. É só seguir a lei, dar 30 dias de aviso prévio, pagar todos os encargos necessários, e pronto. Você se livra da pessoa indesejada.
A pessoa pode até alegar que foi despedida por preconceito, mas caberá a ela provar isso.
O que não pode acontecer – e aí entra a PEC 23/2007 – é usar isso como justa causa para a dispensa de um funcionário. A justa causa – por incompetência, por exemplo – tira do agora ex-funcionário certos direitos, aliviando os encargos do empregador. Claro, uma dispensa por justa causa transfere para o empregador o ônus de provar a justa causa. Quer um conselho: se quiser despedir, despede pagando tudo o que manda a lei, tá?
Agora, insisto. As suas colocações foram bem infelizes, e expôs sim um viés preconceituoso. Desculpe querida, mas você disse textualmente que uma pessoa com orientação homossexual é uma má influência às crianças, além do risco que elas correm de serem molestadas sexualmente! E que a convivência com um homosexual afeta a escolha sexual da criança . Olha... eu já trabalhei contigo e sei que você é boa pessoa. Mas isso é... preconceito. E total falta de conhecimento do que determina a orientação sexual de uma pessoa.
Decepcionante, querida. Ainda mais vindo de uma pessoa que conviveu com o meio artístico, e com inúmeros homossexuais. Entendo (e lamento) que você esteja representando muitas pessoas que pensam como você. Mas quando você diz que representa a população, eu te digo: essa população não sou eu!
Bjs
E que esse seu Deus te ilumine!
Claudio Lins

sexta-feira, 1 de abril de 2011

A ditadura sem maniqueísmos

A estréia da novela “Amor e revolução” está chegando, e com ela esquenta a polêmica em torno do tema “ditadura militar”.  Essa semana eu li num blog (http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/televisao/ferida-aberta/) que a novela “já causa mal-estar entre os militares. Integrantes das Forças Armadas criticam os potenciais efeitos da novela na opinião pública”.
Mas o que me chamou a atenção não foi só a notícia, mas os comentários dos internautas. Surpreendi-me com as defesas apaixonadas e às vezes até radicais, tanto do pessoal da esquerda quanto do pessoal da direita.
Peraí? Esquerda e direita? No Brasil? Aliás, no mundo... o que é isso? Gente! Isso já não significa muita coisa no “mundo globalizado pós queda do muro de Berlim” em que a gente vive. Teve a guerra fria, a Direita venceu onde venceu, a esquerda resistiu onde resistiu, e pronto. Algumas esquerdas vencidas se reinventaram (como no Brasil) e voltaram ao cenário político e até ao poder. Mas já não é a mesma coisa. O mundo mudou.
Lembrando que na década de 60, vivíamos o auge dessa polarização. O pós-guerra de 45 viu o mundo se dividir a ponto de quase chegarmos a uma guerra nuclear. Enfim, só pra ilustrar que pro mundo capitalista de hoje “os inimigos são outros”...
Mas é exatamente porque o mundo mudou, e o tempo passou, que eu tendo a analizar as questões relativas a Ditadura Militar 1964-1985 sem maniqueísmos, deixando os extremos para os extremos, e olhando mais pro meio da balança.
Algumas coisas, por exemplo, são irrefutáveis. Durante um período da ditadura, o Brasil conheceu um crescimento econômico até então inédito para o país, o “milagre brasileiro”. E tem mesmo muita gente que não sentiu em suas vidas os efeitos nocivos da supressão das garantias constitucionais, da falta de liberdade de imprensa, da truculência.  Em muitas cidades, havia até mesmo uma sensação de segurança e prosperidade. Realmente, não foram tantos os que pegaram em armas nem os que morreram e desapareceram, se compararmos com outras ditaduras latinas da época, como as do Chile e da Argentina.
Em outras palavras, entendo que exista um número significativo de pessoas que achem que as discussões que serão levantadas pela novela “Amor e Revolução” ou pela instauração da Comissão da Verdade não vão levar a nada. Posso até supor que seja mesmo uma maioria. Mas... pensem comigo: quando acontece um crime ediondo (que geralmente envolve poucas pessoas), o país pára, a opinião pública se ouriça, a imprensa só fala daquilo! E quando falamos de mais de centena de crimes ediondos, cometidos, senão pelo Estado, no mínimo sob a responsabilidade dele? Afinal, os generais da Ditadura Militar proclamavam (e ainda proclamam!) a disciplina militar como ponta de lança de uma administração austera, positivista e cheia de honra. Mas, a despeito de todas as discutíveis benesses trazidas pelo Regime Militar,  é inegável que houveram graves violações da lei por quem deveria dar o exemplo, e a arbitrariedade comeu solta, até finalmente ser institucionalizada... nos famosos  Atos Institucionais!
Isso é algo, a meu ver, indefensável! Ninguém aqui quer manchar a imagem das Forças Armadas. Porque, no que diz respeito a esse episódio da nossa história, ela já está manchada. E no momento em que toda essa discussão volta a tona, me parece que são as próprias Forças Armadas que querem dar um tiro no pé, quando se colocam contra a discussão.
 E afinal, o que esperar das Forças Armadas? Uma instituição que se preocupa com a sua imagem frente ao público? Ou uma instituição que preza a justiça. Ora, ficar negando a responsabilidade – e eu disse responsabilidade, que não é necessariamente culpa – ficar negando a responsabilidade sobre as torturas, os assassinatos e desaparecimentos? Não colaborar com a revelação dessa verdade – pelo menos em respeito aos que se foram e suas famílias? Definitivamente, não é esse o comportamento que eu espero das Forças Armadas do meu país.
A discussão sobre os motivos ideológicos, políticos e econômicos do Golpe e da ditadura fica pra outra esfera. O que estamos falando aqui é de justiça. Justiça essa que, naquele tempo, foi imparcial com a esquerda vencida. Os crimes cometidos pela esquerda que pegou em armas são notórios e ninguém os nega ou esconde. A maioria foi punida. Ao final da Ditadura, a esquerda revolucionária estava praticamente desmantelada no Brasil.
Por isso, não concordo com os que acham que trazer a discussão dos crimes cometidos durante a Ditadura Militar à luz do nosso tempo possa manchar alguma imagem, ou representar simplesmente uma vingança tardia. Pode significar sim um pouco de justiça – pois a verdade é que justiça tardia não é justiça.
De qualquer maneira, pra quem quer uma outra opinião, mais... digamos... de direita: http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/os-mortos-ditadura-mito-realidade/. Não concordo com a conclusão e alguns pontos-de-vista, mas a análise é interessante.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Bolsonaro está no seu direito... como qualquer idiota!


 Uma vez perguntaram a um presidente americano por que existem tantos idiotas eleitos para cargos públicos. No que ele respondeu: “Porque, numa democracia, os idiotas merecem ser representados!”
 É isso, gente. Democracia é isso. Eu certamente não concordo com as idéias do Dep. Jair Bolsonaro – nem estou dizendo que ele é um idiota – mas tem tanta gente que concorda com ele, que o fizeram Deputado Federal! Também não concordo com a eleição do Tiririca, do Fernando Collor nem do José Sarney... mas eles foram eleitos pelo voto popular, e estão no direito deles.
 Talvez o idiota seja eu, e talvez eu tenha mesmo ajudado a eleger outros idiotas por aí... Será?
 Bom, acho que não. Chega de ser bonzinho! O que posso dizer é que lamento que existam na política pessoas como o Dep. Jair Bolsonaro. Talvez ele não seja mesmo um idiota – e não deve ser, pois está na política há muito tempo. Mas como ele fala idiotices! É lamentável termos esse tipo de representante que não tem capacidade de pensar no todo de maneira generosa. Considera que o único ponto de vista correto é o dele, e que isso é o melhor para todos. Mesmo para os que não concordam com ele.
 Suas opiniões sobre o homossexualismo, por exemplo, são patéticas e infantis. Achar que as pessoas são homossexuais por doença ou má educação é uma opinião tão idiota quanto achar que é a cegonha que traz os bebês. Achar que o homossexualismo destrói a família é demonstrar total desconhecimento do tema. Considerar que uma coisa exclui a outra é o que eu chamo de falta de generosidade no seu ponto de vista. Não é isso o que espero de um representante no congresso.
 Mas... olha que incrível! Numa questão quase que concordamos. É a questão das cotas raciais. Obviamente, sem o radicalismo dele (no seu preconceito, Bolsonaro diz que não gostaria de ser operado por um médico que estudou através do sistema de cotas), também tenho dúvidas a respeito do efeito das cotas raciais. Acho que pode haver sim cotas sociais, mas mesmo assim em caráter temporário, a fim de equilibrar a disparidade de oportunidades entre ricos e pobres. A verdade é que as cotas acabam soando como uma tapa-buracos à péssima educação pública vigente no país.
 Quanto a sua resposta a Preta Gil, onde ele mistura “promiscuidade” com “escolher uma garota negra para namorar”, prefiro realmente acreditar que foi um gafe. Um mal entendido que ele vai ter que esclarecer com a sociedade. Senão, pensaria que o Dep. Jair Bolsonaro é um idiota. E já sabemos que ele não é...

quarta-feira, 30 de março de 2011

O direito de Maria Bethânia

A Lei Rouanet provoca distorções? Provoca, ninguém tem dúvida disso.
Boa parte da produção cultural do país é decidida pelos departamentos de Marketing das empresas? Sim, é verdade... e isso é uma das distorções provocadas pela Lei Rouanet.
Tem muita gente que leva o seu por debaixo dos panos? Acho que tem sim. Ouço muitas estórias dos colegas produtores.
Agora, isso em nada tem a ver com a polêmica em torno da obtenção de isenção fiscal de mais de R$ 1 milhão para o site de poesia de Maria Bethânia. Ela é indubitavelmente uma grande artista, e tem todo o direito de captar recursos para seus projetos. Como qualquer artista brasileiro, aliás.
Já ouvi boatos de que os projetos de Bethânia não passam pela comissão da Lei Rouanet - são aprovados diretamente, por ordem de algum picão. Será verdade? Enquanto for boato, pra mim verdade não é.
Enquanto isso, leiam o texto do ator Odilon Wagner. É um ponto de vista muito bem embasado.
Até!


FÚRIA IDEOLÓGICA


A notícia de que um projeto de poesia de Maria Bethânia, teve aprovação pelo Minc para captar R$ 1.350 milhão, através da Lei Rouanet, vem causando uma enorme polêmica na mídia, ressuscitando uma outra polêmica mais antiga, essa, criada pelo ex ministro Juca Ferreira. Ele deixou um legado perverso para cultura brasileira, dividindo a classe artística, antagonizando o norte/nordeste do país com o sul/sudeste, alegando que os recursos da Lei Rouanet ficavam concentrados nessa última região. No entanto, no marketing de suas idéias equivocadas e de seu esquerdismo infantilóide, ele foi eficiente. Gastou uma fortuna (dinheiro público) rodando o Brasil para destruir a imagem da Lei Rouanet, que mesmo com suas falhas, trouxe benefícios extraordinários para a cultura brasileira.
Mas não se enganem, o único objetivo que o ex-ministro tinha, era ter o controle absoluto da destinação das verbas. Ele não se conformava que o orçamento do MinC era menor do que a verba do incentivo fiscal e ao invés de brigar com seus pares no governo para aumentar o orçamento de seu ministério, preferiu brigar com os artistas, produtores, gestores etc. Para conseguir seu intento, divulgou dados e números nunca comprovados e sempre rebatidos. Era só pesquisar no site do próprio MinC, para que as contradições de seu discurso aparecessem. Porém,  Juca é um grande comunicador, sua campanha difamatória teve sucesso, e é por isso que hoje acompanhamos a polêmica com Maria Bethânia.
A mídia, em alguns casos, tem sido cúmplice desse patrulhamento, fornecendo dados imprecisos e muitas vezes, sem checar suas fontes, acaba levando a opinião pública ao engano. Até mesmo jornalistas importantes como Ricardo Noblat, entraram no jogo. Em sua coluna de 21 de março no “O Globo”, repetiu o discurso inconsistente e os números nunca comprovados de Juca Ferreira.
Não sei porque, sinto um cheiro de revanche e amargor, querendo prejudicar a gestão de Ana de Hollanda, à frente do MinC.
Basta de hipocrisia com a Lei Rouanet. Porque essa fúria ideológica que recai sobre os incentivos fiscais na cultura? Não vejo os que bradam contra a lei Rouanet, se insurgirem contra os incentivos fiscais da indústria eletro-eletrônica, da indústria têxtil, dos taxis, das TVs de plasma, da indústria automobilística e de tantos outros setores. No bolo dos incentivos fiscais do Brasil a cultura tem aproximadamente 1.6% do total. Que fúria é essa? Aliás, só precisamos do incentivo fiscal, porque o orçamento de nosso ministério é o penúltimo da União. Só perdemos para o ministério da pesca. Esse fato demonstra o apreço e importância que a cultura tem para nossos governantes.
Em sua matéria, Noblat cita que a Lei Rouanet só tem boas intenções, mas que sua prática é “quase toda ruim”. Essa informação só pode ter vindo de alguém que nunca pesquisou os resultados da lei nos últimos 15 anos. Noblat assume o discurso beligerante de Juca Ferreira, acusando artistas, produtores e gestores de fazerem negócios escusos com as verbas incentivadas. Se isso for verdade, o ex-ministro Juca Ferreira deveria ser processado por prevaricação, por não ter zelado pelo dinheiro público, pois, não me consta, que alguém tenha sido preso pelos delitos alegados. Se houve alguma ação ilegal, aplique-se o rigor da lei, punam-se os culpados, sejam eles quem forem. Mas, basta de jogar lama em nossa combalida atividade cultural.
Noblat, continua o discurso do ex-ministro, quando alega que, são os departamentos de marketing das empresas que definem a destinação das verbas da Lei Rouanet, mas talvez não tenha se dado conta, que quase 50% desses recursos vem das estatais, ou seja, do governo ou por pressão dele. Por isso a maior concentração de recursos da lei está no Rio de Janeiro, por conta da sede de muitas estatais estarem na antiga capital. Talvez não seja do conhecimento do jornalista, que, apesar da implacável cruzada contra a Lei Rouanet, várias órgãos governamentais se beneficiam dela, como a Funarte (órgão do MinC) e a própria presidência da república, por exemplo, concorrendo de maneira desleal com os produtores culturais. Isso sim, é um escândalo.
Ainda em seu artigo o jornalista traz à tona, um dos episódios mais deselegantes protagonizados pelo ex-presidente Lula, que, no dia do lançamento da “pedra fundamental” do Vale Cultura, acusou empresários paulistas de fazer propaganda com dinheiro do incentivo fiscal. Só a título de esclarecimento, as acusações de Lula nunca foram comprovadas e o Vale Cultura, que não passou de um lançamento festivo em plena campanha eleitoral ainda não saiu do papel, apesar de ser uma unanimidade nacional.
Por fim, o prezado Noblat fala da centralização de recursos incentivados no sul/sudeste, citando números maquiados pelo MinC e acusando um dos mais sérios produtores de São Paulo, Paulo Pélico, de defender essa centralização, fato que nunca aconteceu. Ele, como muitos outros, foram estigmatizados porque sempre combateram as idéias do ex-ministro. Paulo Pélico, sendo um dos maiores conhecedores das leis de incentivo nesse país, sabe muito bem, que a centralização de recursos de fato existe, mas sabe também, que ela foi intensificada pelo aumento da burocracia na gestão de Gil/Juca, não só nos recursos incentivados, mas também no Fundo Nacional de Cultura, o que é mais grave, pois, no FNC é o ministro quem assina o cheque. Pesquisa no banco de dados do Minc nos permitia chegar a essas conclusões, mas, Juca dizia que, “nós não sabíamos ler números”. Números são números e estão à disposição no site do MinC, para quem tiver paciência de estudá-los.
Mas sempre foi assim, Gilberto Gil assumiu o Ministério da Cultura, bradando contra os artistas consagrados que, segundo ele, consumiam quase todos os recursos do incentivo fiscal. Ele estava muito mal assessorado, pois logo se comprovou que a informação era incorreta e ele teve que se retratar. Quando Juca (ex-assessor de Gil) assumiu o MinC, retomou a campanha difamatória contra artistas consagrados, esquecendo que eles são um dos pilares das economias criativas, defendidas pelo MinC, e que tantos benefícios trazem ao país (5% do PIB, segundo o IBGE)
E então me pergunto: Porque uma das maiores artistas brasileiras como Maria Bethânia não pode receber recursos incentivados para fazer seu projeto poético, que vai divulgar e popularizar a arte da poesia? Um projeto que apresentará 365 vídeos dirigidos por outro grande profissional, Andrucha Waddington, o que em termos de tempo, daria aproximadamente 3 longas-metragens. O projeto de Bethânia  disponibilizará tudo isso gratuitamente e tenho certeza, com a qualidade que sempre admiramos em seus trabalhos, desde seu surgimento no Grupo Opinião. Se eu fosse poeta, daria a vida para que ela gravasse uma das minhas poesias, como não sou, dou todo meu apoio, para que a poesia a literatura e a beleza estejam sempre disponíveis na voz de Maria Bethânia.
Isso não tem preço.
Odilon Wagner

Maestro ou gerente de multinacional

Gente: o texto abaixo não foi escrito por mim, mas por meu amigo Alexandre Elias. Acho o ponto de vista dele muito pertinente. Acho só que não é nem 8 nem 80, e concordo que, respeitanto os estatuto e principalmente os músicos mais velhos, a OSB deve sim ter uma manutenção no padrão de qualidade...
Bom, vamos ao texto do Elias, que é muito bom...

Maestro ou gerente de multinacional?

Vou aqui propor idéias parecidas com as de Roberto Minczuc para que não só a OSB, mas toda a nossa música chegue ao nível de “Qualidade Total” que ele procura. Em primeiro lugar, vamos tirar de Heitor Villa-Lobos o mérito de nosso compositor erudito mais genial, porque afinal de contas ele era autodidata, e ainda por cima corre à boca pequena que sua mulher corrigia alguns acordes que ele escrevia para piano... Ora, se queremos ter um nível internacional, não podemos ter um compositor assim nos representando. Vamos trocá-lo por Gustav Mahler, que teve sua formação no Conservatório de Viena. Pronto! Agora Gustav Mahler é o nosso compositor! Por favor, alguém apresente um plano de demissão voluntária póstuma a Heitor Villa-Lobos. E nem pensem em sugerir o nome de César Guerra-Peixe, aquele sujeito que foi pro Recife se misturar com o pessoal do maracatu, que se enturmava com Baden Powell, com o pessoal da música popular. Nem pensar. Plano de demissão voluntária póstuma pra ele também!

E, falando em música popular, podemos reciclar também a nossa. Esse pessoal aí, Chico Buarque, Milton Nascimento, Rita Lee, esse pessoal sabe ler e escrever partitura? Não? Demissão voluntária neles! Elis Regina teve aulas de técnica vocal? Não? E o pessoal da Bossa Nova, que da maneira mais cara de pau assume que são todos desafinados!!! Uma VERGONHA! Plano de demissão voluntária pra todos eles. 

Agora, deixemos a brincadeira de lado. Desde o século passado que pensadores brilhantes como Fredric Jameson, Perry Anderson, Noam Chomsky ou István Mészáros vêm nos alertando para os perigos de um dos mais danosos sintomas do mundo contemporâneo: a subordinação de praticamente todas as atividades humanas às lógicas de mercado, sintoma esse que, infelizmente e fatalmente, já veio se tornar realidade inevitável no mundo da economia do pensamento único.

Para provar que esses homens que citei acima estão certos, basta observarmos agora o exemplo que está acontecendo com a OSB (Orquestra Sinfônica Brasileira), onde o Sr Roberto Minczuc, regente titular e diretor artístico da orquestra, resolveu “melhorá-la” e transformá-la em uma orquestra de “nível internacional”, usando como principal tática uma espécie de “reciclagem” dos músicos, alguns deles com 20, 30 anos de serviços prestados à orquestra ou mais. Pois bem, dentro dessa reciclagem, vemos absurdos como “avaliações individuais dos músicos” e planos de demissão voluntária, para que aqueles que não estejam à altura do que o Sr Minczuc determina como “nível internacional”, sejam substituídos por músicos novos ou estrangeiros. Sim, pois agora a OSB terá dinheiro para pagar salários altos para seus músicos, salários de nível internacional.

Ou seja, analisando pela certeira ótica de Jameson ou Chomsky, o que vemos é o seguinte: Roberto Minczuc não é um regente que foi convidado para assumir a direção artística de uma orquestra. Ele é sim, um alto executivo, pragmático, que foi convidado para reestruturar uma empresa que, mediante a ascensão do Brasil no cenário internacional, quer melhorar sua imagem no mercado, dentro da vitrine em que estamos prestes a ampliar, com eventos como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. E qual seria a tática desse pragmático e eficiente homem de negócios? Simples: adotar os padrões de “Qualidade Total”, termo que surgiu lá na década de 80 como uma espécie de elixir mágico e que rege as regras de administração de empresas como os fastfoods multinacionais. Eu, pessoalmente, tenho pena do país que quer que a música de sua orquestra tenha o mesmo gosto de um Big Mac.

Mas, deixando meus devaneios de lado, será que este senhor é tão insensível e desumano diretor artístico que não se dá conta que esse nível que ele sente falta não seria conseqüência, por exemplo, justamente dos baixos salários a que os músicos da orquestra até hoje vinham sendo submetidos, tendo que então, ao invés de poder ter tempo de dedicação exclusiva ao estudo dos seus instrumentos, desdobrarem-se em outras atividades para completar suas rendas e sustentar suas famílias? Como, por exemplo, dar aulas particulares, aulas em universidades, tocar em outros eventos fora da orquestra, ou o que quer que seja. Será que durante 30 anos uma orquestra mantém um grupo de músicos que se dedicam a ela, mesmo ganhando baixos salários, e quando essa orquestra vislumbra a possibilidade de obter recursos para pagar salários mais altos, dá em troca a esses músicos uma avaliação e um plano de demissão voluntária? É humano ou até mesmo ético isso? Agora que temos dinheiro vamos demitir aqueles que deram sangue aqui durante 30 anos e contratar músicos novos e/ou estrangeiros?

E ainda mais: é essa a formação que o Sr Minczuc quer dar aos jovens da OSB jovem? Propor que eles temporariamente substituam os músicos demitidos até que os virtuosos estrangeiros cheguem? Essa é a formação ética que esses jovens terão para entrar no mercado profissional?

Sr Minczuc, em homenagem ao meu amigo Antonio Augusto, músico da OSB, que teve um enfarte recentemente, cito Saramago para o Sr: “Se tens um coração de ferro, bom proveito. O meu fizeram-no de carne, e sangra todo dia”.
Não estamos lidando com hambúrgueres, e sim com pessoas. Estamos lidando com arte.
Alexandre Elias

quinta-feira, 10 de março de 2011

Forças Armadas resistem à Comissão da Verdade

Eu confesso que, nascido em 1972, fica difícil avaliar a imagem que o Exécito Brasileiro e as Forças Armadas tinham junto a população antes da Ditadura Militar de 1964 a 1985. Mas sei bem a imagem que foi deixada para a minha geração: a de que os militares eram truculentos, aculturados e... enfim, eram motivo de chacotas.
Mas, apesar das evidências deixadas pela história, nunca concordei com essa imagem. Até porque meu avô foi da Marinha, e se ele rompeu com as Forças Armadas por não concordar com a Ditadura, pelos menos o Golpe-Revolução de 64 ele apoiou.
Além disso, ações recentes como a intervenção no Haiti e a ajuda do exército no combate a violência do Rio de Janeiro trouxeram as Forças Armadas de novo pra perto da população.
Por tudo isso, me é decepcionante ler a notícia de que as “Forças Armadas resistem à Comissão da Verdade”(O Globo, 9-03-2011). E mais decepcionante ainda é ver que seus argumentos representam a mesma mentalidade tacanha da época da Ditadura.
Tomo como referência a seguinte declaração do General Leônidas Pires Gonçalves, em vídeo disponível na internet:
“... porque a estrutura funcionava com ordem, com disciplina, com princípio e com vigilância... Agora, quando me perguntam ‘Houve tortura?’, eu digo ‘houve!’ Mas não controlado pela gente. E vai haver sempre na história da humanidade! Na história da humanidade! Porque é a miserável condição humana...”
Essa declaração é bastante ilustrativa da falta de ordem, disciplina, princípio e vigilância que permeou a ditadura militar de 1964 a 1985 no Brasil. O jornalista Elio Gaspari, em seus livros “A ditadura envergonhada” e “A ditadura escancarada” já chamou a atenção pro fato: os militares, ou por conveniência ou por incompetência, fizeram vista grossa para toda a sorte de crueldades que rolaram nos porões. A pergunta é: vão continuar fazendo?
Sim, já se passaram 30 anos. Sim, muitos que viveram aquele período já faleceram. Agora, dizer que a criação da Comissão da Verdade “pretente abrir ferida na amálgama nacional, o que não trará benefício...” é não querer enxergar que a ferida ainda está aberta, e que o benefício histórico é imenso. No mínimo, o benefício de famílias destroçadas por mortes e desaparecimentos ou o benefício pessoal de quem sobreviveu às torturas, estupros, empalamentos, espancamentos ou qualquer tratamento incondizente com o tradicional discurso militar.
Portanto, a melhor defesa institucional das Forças Armadas deveria ser a de apoiar e contribuir com a Comissão da Verdade. Resistir a essa comissão é ingênuo e retrógrado. Pois é a oportunidade de reconhecer erros históricos e punir, mesmo que moralmente, quem com o desrespeito aos direitos humanos manchou seus digníssimos princípios de liberdade e justiça. Ainda que tardia.
Claudio Lins,  10 de março de 2011