sexta-feira, 1 de abril de 2011

A ditadura sem maniqueísmos

A estréia da novela “Amor e revolução” está chegando, e com ela esquenta a polêmica em torno do tema “ditadura militar”.  Essa semana eu li num blog (http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/televisao/ferida-aberta/) que a novela “já causa mal-estar entre os militares. Integrantes das Forças Armadas criticam os potenciais efeitos da novela na opinião pública”.
Mas o que me chamou a atenção não foi só a notícia, mas os comentários dos internautas. Surpreendi-me com as defesas apaixonadas e às vezes até radicais, tanto do pessoal da esquerda quanto do pessoal da direita.
Peraí? Esquerda e direita? No Brasil? Aliás, no mundo... o que é isso? Gente! Isso já não significa muita coisa no “mundo globalizado pós queda do muro de Berlim” em que a gente vive. Teve a guerra fria, a Direita venceu onde venceu, a esquerda resistiu onde resistiu, e pronto. Algumas esquerdas vencidas se reinventaram (como no Brasil) e voltaram ao cenário político e até ao poder. Mas já não é a mesma coisa. O mundo mudou.
Lembrando que na década de 60, vivíamos o auge dessa polarização. O pós-guerra de 45 viu o mundo se dividir a ponto de quase chegarmos a uma guerra nuclear. Enfim, só pra ilustrar que pro mundo capitalista de hoje “os inimigos são outros”...
Mas é exatamente porque o mundo mudou, e o tempo passou, que eu tendo a analizar as questões relativas a Ditadura Militar 1964-1985 sem maniqueísmos, deixando os extremos para os extremos, e olhando mais pro meio da balança.
Algumas coisas, por exemplo, são irrefutáveis. Durante um período da ditadura, o Brasil conheceu um crescimento econômico até então inédito para o país, o “milagre brasileiro”. E tem mesmo muita gente que não sentiu em suas vidas os efeitos nocivos da supressão das garantias constitucionais, da falta de liberdade de imprensa, da truculência.  Em muitas cidades, havia até mesmo uma sensação de segurança e prosperidade. Realmente, não foram tantos os que pegaram em armas nem os que morreram e desapareceram, se compararmos com outras ditaduras latinas da época, como as do Chile e da Argentina.
Em outras palavras, entendo que exista um número significativo de pessoas que achem que as discussões que serão levantadas pela novela “Amor e Revolução” ou pela instauração da Comissão da Verdade não vão levar a nada. Posso até supor que seja mesmo uma maioria. Mas... pensem comigo: quando acontece um crime ediondo (que geralmente envolve poucas pessoas), o país pára, a opinião pública se ouriça, a imprensa só fala daquilo! E quando falamos de mais de centena de crimes ediondos, cometidos, senão pelo Estado, no mínimo sob a responsabilidade dele? Afinal, os generais da Ditadura Militar proclamavam (e ainda proclamam!) a disciplina militar como ponta de lança de uma administração austera, positivista e cheia de honra. Mas, a despeito de todas as discutíveis benesses trazidas pelo Regime Militar,  é inegável que houveram graves violações da lei por quem deveria dar o exemplo, e a arbitrariedade comeu solta, até finalmente ser institucionalizada... nos famosos  Atos Institucionais!
Isso é algo, a meu ver, indefensável! Ninguém aqui quer manchar a imagem das Forças Armadas. Porque, no que diz respeito a esse episódio da nossa história, ela já está manchada. E no momento em que toda essa discussão volta a tona, me parece que são as próprias Forças Armadas que querem dar um tiro no pé, quando se colocam contra a discussão.
 E afinal, o que esperar das Forças Armadas? Uma instituição que se preocupa com a sua imagem frente ao público? Ou uma instituição que preza a justiça. Ora, ficar negando a responsabilidade – e eu disse responsabilidade, que não é necessariamente culpa – ficar negando a responsabilidade sobre as torturas, os assassinatos e desaparecimentos? Não colaborar com a revelação dessa verdade – pelo menos em respeito aos que se foram e suas famílias? Definitivamente, não é esse o comportamento que eu espero das Forças Armadas do meu país.
A discussão sobre os motivos ideológicos, políticos e econômicos do Golpe e da ditadura fica pra outra esfera. O que estamos falando aqui é de justiça. Justiça essa que, naquele tempo, foi imparcial com a esquerda vencida. Os crimes cometidos pela esquerda que pegou em armas são notórios e ninguém os nega ou esconde. A maioria foi punida. Ao final da Ditadura, a esquerda revolucionária estava praticamente desmantelada no Brasil.
Por isso, não concordo com os que acham que trazer a discussão dos crimes cometidos durante a Ditadura Militar à luz do nosso tempo possa manchar alguma imagem, ou representar simplesmente uma vingança tardia. Pode significar sim um pouco de justiça – pois a verdade é que justiça tardia não é justiça.
De qualquer maneira, pra quem quer uma outra opinião, mais... digamos... de direita: http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/os-mortos-ditadura-mito-realidade/. Não concordo com a conclusão e alguns pontos-de-vista, mas a análise é interessante.